Este ano para mim não há Natal. Sempre fui muito fã. Era ver-me numa alegria a montar a árvore e o presépio, cheguei mesmo a adoptar a piroseira de colocar um Pai-Natal a subir pela janela da casa. Tudo, sobretudo, porque mais fã do Natal do que eu só conhecia uma pessoa: o meu pai. Esse sim, dava imensa importância às datas. Morreu na Páscoa, a ver o Ben-Hur, um dos seus filmes preferidos. Na segunda-feira, enquanto lanchava num café, espreitei pelo canto do olho e na televisão passava o Ben-Hur. Voltei a lembrar-me do seu olhar parado naquele dia, a dizer que nunca mais me veria e eu a recusar essa ideia. O certo é que não voltou a olhar para mim.
Para mim, este ano, não há Natal. Não houve luzes brilhantes, nem árvore, nem presépio. Não haverá presentes, nem festa, nem cantorias. Apenas a lareira acesa para iluminar o sofá onde passava a maior parte do seu tempo.
Faço o "sacrifício" de ir aos jantares que organizam. No sábado fui ao do emprego, no próximo irei a um de amigos, na segunda a festa dos miúdos, na terça, a festa dos outros miúdos, que me imploraram para ir. Não posso dizer que não. Nesses dias, coloco o meu melhor sorriso. Não gosto que me vejam como a coitadinha que está triste. Rio muito, digo muitas baboseiras, aliás como sempre o faço. Compro presentes até cinco euros, por não querer ficar de parte, por não querer que os outros possam pensar que eu estou a pensar nele. Fala-se de doenças, de pais, de felicidades. Eu rio e falo também.
Não aceito passar o Natal fora de minha casa. Vai ser só mais um dia. Como se de uma qualquer data se tratasse. Talvez a comida seja igual, de certeza que a minha mãe não deixará que faltem os doces do costume. Este ano seremos só três. Implorei à minha mãe que fóssemos só os três. Para às nove da noite, se me apetecer mesmo muito, já estar deitada na cama com um comprimido no bucho à espera que o dia passe num instante. E que as horas voem. Para não ter de imaginar o meu pai numa cova escura e profunda, tão longe do meu olhar.